Zero vitórias em 36 jogos: a história do Rakvere Tarvas em 2016


Em uma pequena cidade no norte de um país situado na região dos povos bálticos, um clube de futebol lutou durante todo o ano de 2016 por uma missão que, à vista de muitos, é simplória no esporte: conquistar uma vitória. A batalha acabou sem o objetivo alcançado, mas a luta prossegue. A cidade é Rakvere e o clube, o Rakvere Tarvas, terminou sua primeira temporada na elite da Estônia sem nenhuma vitória, transformando-se no clube de pior aproveitamento numa primeira divisão no ano - o B68 também não venceu na temporada das Ilhas Faroe, mas ao menos empatou sete jogos.

Andres Rattassep é torcedor e assessor de imprensa do pequeno Tarvas, clube criado em 2004 e que recolocou a cidade de Rakvere, de 15 mil habitantes, no mapa do futebol estoniano depois de 55 anos. Quando o árbitro apitou o fim do jogo contra o Sillamäe Kalev, Rattassep e a pequena legião de torcedores dos Touros de Rakvere percebera a triste constatação da tabela: zero vitória, três empates e 33 derrotas ao longo de penosas 36 rodadas. 


Torcida do Rakvere comemorou só três vitórias em 2016, todas na copa nacional
Antes de falar desta campanha, é preciso conhecer o clube e sua realidade. O Rakvere Tarvas era o único clube amador entre os dez participantes da Premium Liiga. O único a não pagar salários ou bônus aos seus jogadores, que estudam e trabalham em outras cidades. “Os jogadores mais jovens querem uma vitrine para atingir o nível profissional, mas há quem jogue apenas por amor ao clube. Muitos estão conosco há quase dez anos, quando jogávamos divisões amadoras”, revela Rattassep.

O sonho de chegar à primeira divisão para os garotos de Rakvere tornou-se realidade no fim de 2015, com o quarto lugar na segunda divisão. Apenas o campeão subiria. Acontece que os três primeiros colocados eram times B de clubes da elite, o que os impedia de obter o acesso. “Conseguir o acesso significava uma histórica temporada pela frente. Muitos dos jogadores nasceram e treinaram a vida toda em Rakvere, então queríamos dar-lhes a chance de jogar em alto nível. Não queríamos perder nossa identidade”, relembra o torcedor. A vaga na elite caíra no colo do Tarvas, mesmo com mais derrotas do que vitórias e saldo de gols negativo.



A comemoração do Tarvas pelo acesso no fim de 2015
O objetivo na Premium Liiga era modesto: atingir o oitavo lugar, com sorte. Mas as coisas ficaram sempre longe disso. Foram muitas lesões, muita dificuldade em trazer reforços - até por ser o único clube da primeira divisão a não pagar salários -, e o público fiel cada vez mais cansado de perder. O primeiro ponto ganho só veio um mês após o início da liga, e o segundo levaria mais quatro meses.

Conforme Rattassep, a diferença entre os clubes profissionais, semiprofissionais e amadores na Estônia é gigantesca, o que ajuda a explicar placares como 36 a 0, ocorridos recentemente na Copa nacional. Mesmo assim, a cidade entendeu a realidade do clube. “Os jogadores também sabiam que era difícil enfrentar rivais mais bem preparados. Jogos você pode perder, mas jogar em sua cidade natal, em frente aos seus familiares e amigos, que é a maior motivação para nossos jogadores, isso você não perde”, reitera.

Mas há momentos bons para recordar de uma campanha com um saldo de gols negativo de 98? Claro que sim. O primeiro gol em casa (que representava o primeiro gol na elite estoniana acontecido em Rakvere em mais de 50 anos), o primeiro ponto na Premium Liiga, o primeiro (e único ponto) diante de sua torcida... Conquistas modestas, mas significativas e emocionantes para o clube.



Campanha do time foi a única de elite europeia sem vitórias no ano
Para efeitos de comparação, o Internacional foi o clube com a maior sequência sem vitórias neste Brasileirão: 14 jogos consecutivos. O Tarvas passou 36, e dentro deste período chegou a ter 16 derrotas em sequência. Só que o lema do clube, “Me ei anna alla, mitte kunagi!”, algo como “Nós não desistimos, nunca!” não foi deixado de lado.

O próximo objetivo já está traçado: vencer jogos na segunda divisão e retornar à elite. “A maioria dos jogadores continuará conosco, eles estarão mais experientes e vamos tentar levar a temporada de 2016 por um lado positivo”, diz Rattassep. O aprendizado na primeira divisão foi duro, mas servirá para os Touros de Rakvere amadurecerem e conquistarem aquilo que faltou na liga nacional: vitórias em campo. Fora dele, elas já vieram.


Imagens: Rakvere Tarvas
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